A morte de uma estudante e a descoberta
da luta pelo Socialismo
A busca pela felicidade é
uma constante humana, os sonhos de uma vida melhor, sempre envoltos na
perspectiva de melhora. Filosoficamente falando é uma liberdade, mas que
objetivamente ainda é uma utopia. Desculpe a franqueza, mas é o que acho.
Durante minha juventude tive
a oportunidade de fazer parte do Movimento Estudantil, que tempo bom, à época a
juventude ainda era assombrada pela falta de democracia, como por exemplo, obrigada
a usar uniforme na escola, enfrentando fila para ter acesso ao prédio, do
Colégio Lauro Sodré, inclusive para subir as escadas, aos olhos vigilantes da
Marina, que nunca tirava o lenço da cabeça, que em comentários diziam que ela
era careca, mas lendas a parte o processo de lutas democráticas inspiravam
minha geração, que nasceu em plena ditadura militar.
A lei do Grêmio Estudantil
foi promulgada em 1985, no ano seguinte estava fundando a Associação de Aluno e
Ex-Alunos do Colégio, enfim, o Lauro Sodré era um tradicional colégio do
Estado, no final do século XIX foi considerado um dos três melhores do mundo,
mas naquele ano de 1986 a escola estava caindo aos pedaços, um prédio que
exigia uma manutenção permanente, em compensação tínhamos professores que
valiam a pena, como o Haroldo de História, que era da antiga Convergência
Socialista, o Geogenor e o Ofir de Matemática, o Augusto de Ciências que
militava no Partidão e para não fugir a regra tinha a reação em pessoa, o cão
desencarnado do inferno (figura de linguagem),
a Vera Lúcia de Geografia, essa merece um capítulo a parte.
Contudo foi em 1988 que
começamos a debater mais intensamente o Grêmio Estudantil, lembro que no turno
da tarde estudava os alunos da sétima e da oitava série do primeiro grau, os
alunos da quinta e da sexta no turno da manhã e o segundo grau à noite. Logo após
as férias de fim de ano voltamos para a escola, na época a Secretaria de
Educação era a Terezinha Gueiros, então primeira dama do Estado, depois de
algumas prorrogações a direção da escola tinha decidido sobre um limite de dada
para entrar na escola com o uniforme, toda a luta do Grêmio começou com essa
demanda.
Lembro que já estava na
escola a três anos, desde a quinta série, e na oitava já estávamos na reta
final, e conhecíamos todo mundo, o Lauro Sodré tinha um vida acadêmica agitada,
a equipe de vôlei, de futebol, de handebol, tinha o teatro, a banda musical, o
clima da escola com vários locais de encontros e desencontro, em um período de
descobertas, os porões eram sempre visitados em suas diferentes entradas, sem
contar as idas ao Bosque, mas isso é tema para outra história.
Enfim, vários personagens
que comporiam o Grêmio já eram figuras carimbadas, o César e eu de certa forma
no turno da tarde tínhamos maior inserção, o Cesar já pela sua capacidade de
leitura e oratória sem iguais e eu por ser da equipe de Vôlei, que me dava
certa popularidade, tinha ainda a Andréa, minha irmã que sempre foi uma figura
presente e marcante na luta do dia-a-dia do colégio, a Adriana com uma liderança
respeitada, a Elis, a Luciana, a Lena Claudia, o Dinorlan, o Miguel, tanta
gente, mas basicamente esse era o núcleo e boa parte dele morava no Conjunto
Maguari.
Estou lembrando isso por que
hoje dia 03 de fevereiro de 2013, uma companheira completaria 40 anos, a
Giselle Miranda, que foi atropelada em uma manhã de setembro de 1988, não sei
se mais alguém lembra a data, mas não podia deixa passar em branco, a Giselle
não participava diretamente do Grêmio, mas em vários momentos ela sempre foi a
primeira a sair para as passeatas em sua sala, lembro dela como um menina que
sempre estava curiosa, queria conhecer a vida em sua plenitude, confesso que
sempre a olhava com curiosidade, mesmo naquele período eu já olhava as pessoas
enquanto perspectiva.
Como eu praticamente vivia
na escola, tinha treino de vôlei toda manhã, e as atividades do grêmio, entrava
na escola as 7 da manhã e saia a noite, esse período conheci o Reginaldo, o
Eliezer, o Newton e o Afonso, que completariam a direção do Grêmio, lembro que
o Newton Pereira foi eleito na reunião da chapa para ser nosso candidato a
Presidente do Grêmio, que depois foi batizado de Giselle Miranda.
A morte da Giselle foi um
pouco depois da eleição do Grêmio, o nome da nossa chapa era “Em Prol da
Juventude”, lembro que fui contrário, mas a Adriana soube defender e teve logo
o apoio do pessoal da noite, mas enfim, estávamos a pouco tempo empossados, e a
Giselle veio a falecer naquela manhã de setembro, e eu estava na escola,
chegamos a socorrer, mas ela não resistiu ao impacto do atropelamento, a
notícia de sua morte só chegou na manhã seguinte.
Lembro-me de ter chegado na
escola por volta das oito da manhã, e assim que pisei na calcada central vi
toda a movimentação, os alunos por iniciativa própria não tinham entrado nas
salas, ficaram na frente da escola, prática comum, pois quando tínhamos alguma
manifestação para ir nos concentrávamos na frente do prédio para sairmos em
caminhada. Quando vi aquela multidão já sabia o que tinha acontecido, confesso
que fiquei receoso em continuar minha caminhada em direção a entrada da escola.
Da parada do ônibus até a
escadaria em frente a escola são pouco mais de 300 metros, vi vários rostos
conhecidos me olhando, algumas pessoas se aproximaram, lembro de reconhecer o
rosto do Dino, assustado ele chegou e me disse “o que vamos fazer?”, fiquei sem
palavras e continue a caminhar, fui direto para a sala da direção da escola,
que eu frequentava costumeiramente, antes entretanto de chegar na sala para
falar com a diretora, fui abordado pela professora Ana, de português, falando
que essa era a hora do Grêmio tomar uma atitude.
Não sabia exatamente o que
deveria ser feito e como ser feito, mas a primeira coisa ha saber era o que
estava acontecendo, se a espontaneidade dos alunos de não entrarem era
verdadeiro ou uma ordem da direção da escola? Quando cheguei à sala da Diretora
ela veio logo perguntando quem eu era para não deixar os alunos entrarem na
escola, fiquei meio perplexo mais fiquei calado, e percebi que em sua sala
estava a mãe da Giselle, reconheci ela por que tinha participado de uma reunião
entre os pais e a direção da escola algumas semanas antes e ela estava lá, ela comentou
que ainda não tinha local para realizar o velório, logo veio a ideia de
realizar no auditório do Colégio, assim que o corpo fosse liberado, a assim
ficou combinado entre a direção, o Grêmio e os familiares.
Depois fui para frente da
escola, e juntei as centenas de estudantes que se encontravam na frente da
escola e comecei a falar da reunião que decidira realizar o velório, e sugerir
que todo mundo fosse para suas casas e tarde voltasse para a chegada do corpo,
quando deu umas 11h fui embora para casa para voltar o mais rápido possível.
Os acontecimentos da tarde daquele
fatídico dia estão vivos na minha memória, como se fossem hoje, foi na verdade
meu batismo de fogo na luta, mas é outra história, estou a anos trabalhando na
pesquisa e colhendo o material, ainda falta fazer várias entrevistas, mas é um
desafio que encaro com maior prazer, contar nosso lado da história.
Lembrar da Giselle em seu
aniversário, depois de tanto tempo renova um significado que a luta por
mudanças sociais ainda são necessárias, que ainda temos muito que caminhar, sei
que se ela viva estivesse, estaria ainda me olhando e dizendo que seria a
primeira a levantar da cadeira para a passeata, que essa data seja lembrada com
tristeza, mas também com o desafio de continuar a luta por uma sociedade
socialista.
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