sexta-feira, 29 de março de 2019

2. REFERENCIAL TEÓRICO


2.1 Aprendizado nas Organizações


Para Kanaane (1995, p. 62),

a organização é um sistema integrado de subsistemas interdependentes, havendo intercâmbios entre os respectivos elementos: clima, cultura, estrutura, sistemas administrativos. A missão, os objetivos, a tecnologia, o produto, as atividades, a própria estrutura e os trabalhadores constituem o nicho organizacional.

Pode-se entender, então, que a organização é, em sua essência, o produto da integração dos membros que a compõem, pois o resultado das mais diversas personalidades que nela interagem com os seus valores e crenças possibilita à empresa constituir uma identidade própria.
A cultura de uma organização se desenvolve na medida em que as pessoas aprendem a achar soluções para as questões internas e externas com que se deparam os sistemas sociais.
De acordo com Schein (1986, p. 56):
Cultura organizacional é o padrão de premissas básicas que um determinado grupo inventou, descobriu ou desenvolveu no processo de aprender a resolver seus problemas de adaptação externa e de integração interna e que funcionam bem o suficiente a ponto de serem consideradas válidas e, portanto, de serem ensinadas a novos membros do grupo como a maneira correta de perceber, pensar e sentir com relação a esses problemas
.

Isso evidencia a presença do aprendizado humano em toda e qualquer situação da vida humana associada. Popularmente, o termo cultura se refere ao modus vivendi de qualquer sociedade e até mesmo à bagagem de conhecimentos adquiridos por uma pessoa no decorrer de sua vida, através de experiências pessoais ou daqueles adquiridos nos bancos escolares.
Para Schein (1982, pg. 12)

cultura organizacional é um conjunto de pressupostos básicos inventado, descoberto ou desenvolvido por um dado grupo, à medida que aprende a lidar com seus problemas de adaptação externa e de integração interna, que tenha funcionado bem para ser considerado válido e, assim, ser ensinado a novos membros como forma correta de perceber, pensar e sentir em relação àqueles problemas.

Nesse sentido a cultura assume importância a medida que se compreende a função da cultura organizacional  nos diferentes setores da organização, pois a ele compete não somente as estruturas formais de poder, mas as informações e com elas toda uma sorte de elementos que permite distinguir as ações diária dentro da organização
Para Srour (1998, p. 56)
a cultura organizacional forma um sistema coerente de significações e funciona como um cimento que procura unir todos os membros em torno dos mesmos objetivos e dos mesmos modos de agir. Sem referências próprias, as organizações ficariam à mercê das convicções individuais de seus membros diante de situações novas e certamente sofreriam prejuízos dada a disparidade de procedimentos e orientações.

Ao conceituar clima organizacional, há uma necessidade de diferenciação em relação a outros conceitos que se assemelham. Clima organizacional se refere a descrições coletivas do ambiente da organização, enquanto que o clima psicológico, às vezes usado como sinônimo, é pertinente às descrições individuais dos processos organizacionais (JOYCE & SLOCUM apud BÄR, 1995, PG. 53)

2.2 O Processo de Aprendizagem Individual


Para Fleury (1995, PG. 14), “aprendizagem é um processo de mudança resultante de prática ou experiência anterior, que pode vir, ou não, a manifestar-se em uma mudança perceptível de comportamento”. O que cabe destacar é que a organização que faça a opção pelo treinamento acredita na aprendizagem individual de seu colaborador e certamente ao fazer esse tipo de investimento terá resultados futuros garantidos.
Duas vertentes teóricas sustentam os principais modelos de aprendizagem: o modelo behaviorista e o modelo cognitivista. No caso do primeiro, o foco principal é o comportamento, que é observável e mensurável, partindo do princípio que a análise do comportamento implica no estudo das relações entre eventos estimuladores, respostas, conseqüências. Planejar o processo de aprendizagem implica definir todo o processo em termos passíveis de observação, mensuração e réplica científica.
O modelo cognitivista caracteriza-se por ser mais abrangente do que o behaviorista, explicando melhor fenômenos mais complexos como a aprendizagem de conceitos e solução de problemas. Considera dados objetivos, comportamentais e subjetivos, levando em consideração as crenças e percepções dos indivíduos que influenciam seu processo de apreensão da realidade.
“A aprendizagem constitui um evento interno, não observável, inferido através do desempenho das pessoas” (LOMÔNACO apud FLEURY, 1995, p. 13). O homem aprende através de processos interativos, conduzindo experimentos e observando suas conseqüências, compreendendo e aprimorando o que aprende.
A aprendizagem humana pode acontecer de duas maneiras diferentes: a aprendizagem por descoberta a partir de uma ação e a aprendizagem por instrução. A aprendizagem por descoberta, também conhecida como aprendizagem em primeira pessoa, nos leva a um saber fazer e a aprendizagem por instrução, ou seja, em terceira pessoa, nos conduz ao simples saber.
Em primeira pessoa, a aprendizagem possibilita ao aprendiz uma compreensão do saber, pois fazendo ele pode construir o aprendizado e, com isso, pensar o seu próprio pensamento. A aprendizagem em terceira pessoa consiste numa transferência pura e simples de conhecimento, o que inviabiliza ao indivíduo a criação da sua própria opinião e de diferentes ideias sobre o mesmo tema.
Handy (1995) explica isso através do que ele chama de Ciclo de Aprendizagem (Figura 1), que pode ser visto como um círculo composto por quatro momentos: questionamentos, ideias, testes e reflexões. A curiosidade leva o indivíduo a questionar. Esse questionamento dará origem às ideias e captura de informações. Isto por sua vez, vai exigir a experimentação para a comprovação. O resultado final será alcançado depois de reflexão e análise.  Essa conclusão será questionada e o processo se reinicia, tornando-se sucessivo.


Figura 00 - Ciclo de Aprendizagem
Fonte: Handy (1995).

O aprendizado só acontece se o ciclo se processa inteiro. É a transição de um saber fazer a um saber que caracteriza a aprendizagem. Mas isso não ocorre naturalmente, ou seja, a aprendizagem só vai ter realmente acontecido quando o indivíduo for capaz, após ter feito uma reflexão sobre o assunto, de construir uma maneira própria de justificar os resultados obtidos. O aprender a aprender consiste na automatização deste processo de abstração reflexiva, levando o indivíduo à capacidade de pensar o seu próprio pensamento.

2.3 A Aprendizagem Organizacional


Entender como se dá a aprendizagem humana nas organizações é o ponto de partida para se começar a trabalhar uma questão que vem desafiando o ser humano trabalhador: a velocidade com que as mudanças acontecem versus a capacidade do indivíduo de absorver tanta informação que chega até ele.
Em outras palavras, o desenvolvimento tecnológico se desenvolve de tal maneira, que a educação humana já não tem se demonstrado capaz de acompanhá-lo. Os canais de comunicação têm se ampliado e as pessoas recebem milhares de informações todos os dias o dia inteiro. Mas muitas destas informações precisam se tornar conhecimento a fim de manterem o trabalhador capaz de desenvolver as suas atividades de acordo com o que o mundo impõe. Eis a grande dificuldade: como proporcionar ao ser humano um mecanismo que, se não zerar esta diferença, pelo menos o faça perceber-se num ritmo mais justo e realmente produtivo. Um efetivo processo de mudança vai passar, necessariamente, por um grande processo de aprendizagem.
Diversas rotinas são desenvolvidas no cotidiano das empresas. Em outras palavras, procedimentos relativamente padronizados são criados para lidar com problemas internos e externos. Estes vão se incorporando de forma explícita ou inconsciente na memória organizacional, sugerindo que o aprendizado organizacional pode acontecer de maneira acidental ou intencional. O aprendizado não acidental ou intencional geralmente começa com uma conscientização da necessidade de mudar alguma coisa ou em função de um sentimento de insatisfação. O processo de aprendizagem em uma organização não só envolve a elaboração de novos mapas cognitivos que possibilitem a melhor compreensão do que está acontecendo em seu ambiente externo e interno, mas também a definição de novos comportamentos que comprovam a efetividade do aprendizado.
Para Hedberg (apud FLEURY, 1995), as organizações podem não ter cérebros, mas têm sistemas cognitivos e memória. Garvin et al (1998) diz que o processo de aprendizado em uma organização, assim como o aprendizado individual, é composto de quatro fases: conscientização, compreensão, ação e análise.
A diferença consiste no fato de que no aprendizado organizacional estes quatro estágios representam tarefas coletivas: criar uma conscientização compartilhada da necessidade de aprender, desenvolver uma compreensão comum do que precisa ser feito, iniciar ações alinhadas com a estratégia corporativa para melhorar o desempenho e conduzir análises conjuntas tirando conclusões.
Para Senge (1990), as organizações devem desenvolver o que ele chama de cinco disciplinas fundamentais para este processo de inovação e aprendizagem. Ele se refere a elas como cinco programas permanentes de estudo e prática que levam ao aprendizado organizacional.
A primeira disciplina, chamada por ele de domínio pessoal, é a disciplina do auto-conhecimento. Significa aprender a expandir as capacidades pessoais para obter os resultados desejados e criar um ambiente organizacional que estimule a todos os participantes na busca das metas definidas.
A segunda disciplina, modelos mentais, consiste em refletir, esclarecer e melhorar continuamente a imagem que cada um tem do mundo, com o objetivo de adaptar atitudes e decisões.
A terceira é o que o autor batizou de visão compartilhada ou objetivo comum, que consiste em estimular o engajamento do grupo em relação ao futuro, elaborando as diretrizes que permitirão seu alcance.
A quarta disciplina, o aprendizado em equipe, transforma talentos e idéias individuais em coletivos, de maneira que a soma do conhecimento do grupo seja maior do que o conhecimento individual.
O pensamento sistêmico é a quinta disciplina. Integrando as demais num conjunto coerente de teoria e prática, cria uma forma de analisar e uma linguagem para descrever e compreender as forças e inter-relações que definem o comportamento de cada sistema, evitando que as demais sejam vistas e analisadas de forma isolada. O pensamento sistêmico proporciona maior eficácia nas mudanças, além de fazê-las de acordo com o que o ambiente exige.

2.4 Conceitos Relativos a Organizações de Aprendizagem



Deve-se compreender que o processo relativo a aprendizagem nas organizações passa fundamental por descobrir que:

Um pensamento de organização que não compreende a relação auto-eco-organizadora, isto é, a relação profunda e íntima com o meio ambiente, que não compreende a relação hologramática entre as partes e o todo, que não compreende o princípio de recursividade, um tal pensamento está condenado à insipidez, à trivialidade, isto é, ao erro. (MORIN, 1990, p.179.)

O trabalho pode ser caracterizado como o resultado da ação intencional dos homens sobre a natureza. Este processo reproduz um dilema, onde por um lado possibilita inovações científicas, tecnológicas e organizacionais, mas por outro demonstra o quanto o homem foi transformado em mero objeto das relações de trabalho.
Atualmente, a tecnologia determina os processos e a organização do trabalho e isso de certa forma coloca a figura humana em segundo plano. A objetividade científica e da tecnologia se tornaram indiferentes a certos critérios éticos. A Escola das Relações Humanas de Elton Mayo (apud HERSEY et al, 1995) afirma que além de se procurar os melhores métodos tecnológicos para aumentar a produção, é fundamental a preocupação com a questão humana. Em outras palavras, sustenta que os verdadeiros centros de poder numa organização são as relações interpessoais que se desenvolvem no ambiente organizacional.
Schein (1982) diz que para se compreender como as organizações funcionam, é necessário, em primeiro lugar, compreender como funcionam as pessoas nessas organizações. Com a mudança das oportunidades e desafios empresariais, as pessoas estão mudando os processos de trabalho, as suas relações, o seu relacionamento com as tecnologias e mesmo os valores e as direções adotadas. Assim, a flexibilidade torna-se mais do que uma necessidade em um tipo de vida em que tudo se transforma rapidamente.
A organização de aprendizagem consiste em um modelo que eleva o papel do ser humano nas organizações envolvendo seus corações e suas mentes num processo de aprendizado e de mudança contínuo, harmonioso e produtivo, sendo projetada para atingir os resultados desejados através da enorme força criativa de cada um dos indivíduos comprometidos com tal organização.
Senge (1998) define uma organização de aprendizagem como aquela na qual as pessoas aprimoram continuamente suas capacidades para criar o futuro que realmente gostariam de ver surgir. Ele afirma em relação a isto que a tecnologia não tem um impacto tão grande assim, afinal as mudanças nessa área sempre estiveram relacionadas com as pessoas e não com a tecnologia.
Uma pessoa pode até receber mais informações graças à tecnologia, mas se não possuir as capacidades necessárias para aproveitá-las, não adianta. Segundo Bartlett et al (1998), a era do planejamento estratégico está se transformando rapidamente em era do aprendizado organizacional. Um estudo realizado por eles durante seis anos, envolvendo vinte empresas que passaram por uma transformação profunda para se tornarem um modelo de organização capaz de sobreviver, evidenciou três características presentes em todas as empresas estudadas: o foco nos melhores funcionários, os fluxos horizontais de conhecimento e a cultura de confiança.
Numa economia baseada em serviços e na era da informação, o recrutamento e o desenvolvimento de pessoal tornaram-se funções fundamentais. Essas atividades podem ser consideradas atualmente como o âmago da competitividade de uma empresa. Por isso, a função de recrutamento é acompanhada pelos próprios executivos da empresa da alta administração e o tempo despendido para isso não é mais mínimo. Manter estes funcionários especiais também é tarefa fundamental e constante.
Além desta poderosa ferramenta, a caça a pessoas especiais, existe também a necessidade da criação de um fluxo horizontal de conhecimento que consiste na montagem de canais de comunicação que facilitem a distribuição rápida de informações estratégicas.
A organização voltada para o aprendizado precisa ser capaz de transferir, compartilhar e alavancar conhecimentos e experiências fragmentados. Outra característica encontrada, a cultura baseada na confiança, é de grande importância para que as pessoas troquem estas informações e experiências que antes constituíam sua fonte de poder. Mas para criar esta cultura é exigido que um conjunto autêntico de valores e crenças comuns unam os vários membros da organização
Além das pessoas e da produção, existe uma terceira dimensão: a plenitude. Esta constitui a mola mestra deste novo modelo de organização, ou seja, uma cultura organizacional holística. As organizações e através delas as tecnologias, devem contribuir para que o homem atinja plenamente o seu potencial, o seu destino de maneira inteira e completa. Além de se apresentarem como uma grande escada para o sucesso do homem, as organizações podem contribuir para devolver a dignidade ao trabalho humano.