sábado, 27 de outubro de 2012

AS METROPOLES SEUS DESAFIOS E PESPECTIVAS

Texto mandado pelo companheiro Carlos Sérgio (Carlão) de Brasília!


A metropolização consiste, no processo socioespacial que melhor traduz o estágio atual do desenvolvimento do planeta. No Brasil as questões associadas as metrópoles são marcadas pelo modelo centro-periferia  de expansão das cidades, segundo o qual a maior parte da população moradora nas periferias distantes, não tem acesso a cidade e a urbanização e as suas infraestruturas e seus equipamentos.
Esse modelo foi tratado (Por Santos, 90), o crescimento por expansão horizontal e não por adensamento associado a ocupação de áreas periféricas distantes e ambientalmente frágeis, opões realidades completamente distintas entre os centros dos municípios sede das Regiões metropolitanas e as periferias e os demais municípios.





As metrópoles contemporâneas são os maiores objetos culturais jamais construídos pelo homem. Nas ultimas décadas, elas trabalham em compasso com o ritmo do mundo, na medida em que a realidade da globalização se impõe sobre o processo secular de internacionalização. Desse modo, essas metrópoles funcionam e evoluem segundo parâmetros globais. Mas elas têm especificidades, que se devem à história do país onde se encontram e à sua própria história local (SANTOS, 1990, p. 9).



A metropolização não consiste, em um fenômeno, trata-se de um processo histórico que expressa a estrutura, a forma e a dinâmica socioespacial e assume algumas feições particulares na sociedade de consumo, especialmente em sua periferia. Compreender a metropolização, é compreender um pouco mais do funcionamento e da dinâmica do capitalismo, notadamente a partir da forma como nele se produz o espaço social urbano.
As transformações por que passa o capitalismo causam efeitos importantes sobre as Regiões Metropolitanas: maior velocidade dos fluxos financeiros e de mercadorias, em um mercado cada vez mais internacionalizado; reestruturação produtiva da atividade industrial, que permite a fragmentação de sua produção; e a dinâmica do setor de serviços, que se transforma e contribui, seja para a velocidade dos fluxos financeiros e comerciais, seja para a reestruturação produtiva. Estas transformações geram maiores incertezas quanto à localização das atividades no território e, assim, reforçam a centralidade e o papel atual das metrópoles no mundo.
A unicidade da técnica (SANTOS, 1996), base material do capitalismo contemporâneo e da globalização, permite que, pela primeira vez na história, o mundo seja reconhecido em sua totalidade, alavancando infinitesimamente a importância dos meios e dos lugares que concentram as possibilidades para que sejam feitas as escolhas, tomadas e repercutidas as decisões das firmas, organizações e pessoas. As metrópoles, as principais cidades do mundo, assumem então posição de destaque na divisão internacional do trabalho.
Enquanto tal, o processo de metropolização não pode ser traduzido somente a partir da perspectiva das economias de escala associadas à urbanização em geral. Consiste em processo cuja compreensão não se esgota nas análises e nas contribuições teóricas de nenhum campo particular de investigação científica e de reflexão crítica.
A constituição e a ampliação das metrópoles configuram um processo vigoroso e dinâmico, baseado na transformação e na construção de espaços urbanos que trazem desafios ampliados para a sociedade e o Estado à medida que condensam um amplo conjunto de demandas e desafios que expõe a lógica da gestão fragmentada dos territórios. A lógica e a dinâmica da metropolização sobrepõem-se à estrutura e à organização políticoadministrativa de planejamento e gestão do território e trazem questões que não são apenas de uma escala ampliada, mas também de um escopo alterado, na medida em que a metrópole é mais do que a soma de suas partes.
Sendo um processo histórico e social multifacetado, a metropolização demanda um esforço de investigação e reflexão interdisciplinar. As metrópoles se definem muito mais por suas dinâmicas do que por suas dimensões. Por exemplo Belém, é composta por poucos municípios enquanto São Paulo e outras RM são constituídas por grande quantidade de municípios. Parece haver um debate quanto à importância dos critérios de grandeza e dimensão quando comparados aos critérios que buscam abarcar as dinâmicas e as relações de interdependência existentes em determinado território e os meios que viabilizam a integração de suas diversas funções. Quanto a gestão do território, não é apresentado nenhum instrumento que possa colaborar na superação dos impasses metropolitanos evidentes que são a geratriz do caus na saúde, na segurança, na mobilidade, no saneamento, etc.
Após CF/88, teve inicio  um fenômeno paralelo ao processo socioespacial da metropolização, a saber, a metropolização institucional, com a criação de RMs, a partir dos Estados. O Art. 21 da CF/88 estabelece que compete a união “elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social”. Existe uma tentativa de regulação pela proposição do PL no 3.640/2004 (Estatuto da Metrópole) que propõe a uma regulamentação das unidades regionais urbanas, que organize a ação dos entes federados nos territórios em que funções públicas de interesse comum devam ser compartilhadas.
O PL 3.940 trata da continuidade da urbanização entre municípios e da dimensão populacional destes. Mas quando o legislador parte dos fatos e da realidade efetiva, geralmente a norma instituída tende a ser menos eivada de erros e mais condizente com as necessidades do conjunto da sociedade, pois deste modo, evita-se a criação de leis com base apenas em grupos de pressão e deslocadas da realidade. Porem, é mais comum que gestor do aparelho estatal estabelecem normas que não tem qualquer relação com a realidade para em seguida fazer os necessários ajustes os quais em geral tornam-se verdadeiros imbróglios de difícil desfecho, é o que se vê, por exemplo, com o conjunto de normas que regem a gestão das Regiões Metropolitanas.  Atualmente sem critérios, ou normas legais, o governo federal aceita qualquer definição feita pelos Estados, mais pouco se tem avançado institucionalmente e gerencialmente na gestão dos territórios em regiões metropolitana. A autonomia municipal expressa na CF/88, e o fato de haver um elevado grau de liberdade para a construção dos desenhos institucionais na gestão metropolitana, com pouca interferência do governo federal, condicionam a cooperação dos entes federados em partilhar as competências da gestão metropolitana das funções públicas de interesses comuns.
As contradições entre a metropolização e a organização e estrutura político-administrativa do Estado foram ampliadas, no caso brasileiro, pelo tipo de federalismo tridimensional existente. A gestão da questão metropolitana, com todas suas ambivalências e paradoxos, passa a depender, fundamentalmente, da cooperação de entes municipais pouco estimulados ao estabelecimento de soluções cooperativas e pouco habituados a estas práticas que, em tese, pretendem, em alguma medida, superar os condicionantes político-partidários apontados por Rocha (2006).
Da década de 1970 até meados dos anos 1980, quando houve a implantação das RMs a partir do Estado central, seguiram uma política e um planejamento urbano centralizado, tecnocrático e autoritário. As RMs criadas eram vistas como entes estratégicos do projeto nacional, fortes investimentos foram feitos para a modernização dos circuitos da produção comandados pelas metrópoles e os conflitos federativos eram amainados pela simples inexistência de diálogo ou qualquer cooperação entre municípios e esfera metropolitana. A política metropolitana era centralizada, partindo das definições da União para o comando dos estados sobre o conjunto de municípios. 
Após a CF/88, a instituição das RMs é marcada pela redemocratização do Estado, pela descentralização política e pela autonomia municipal, críticas aos modelos centrais e autoritários de política e planejamento urbano; pela transferência das incumbências da política metropolitana aos estados; pela criação de diferentes formatos institucionais para as RMs no país; e pela falta completa de meios e recursos necessários para a efetiva implementação das RMs. Em suma, há um esvaziamento institucional, político e financeiro dos órgãos metropolitanos, que se soma ao acirramento dos conflitos de interesses entre municípios e entre municípios e estado.
O cenário formado nesses dois momentos distintos caracteriza a atualidade da política metropolitana no Brasil. A fragilidade dos aspectos políticos, financeiros e institucionais da gestão contribui para a inexistência de um efetivo e necessário pacto político, social e territorial para a efetivação das RMs.
O maior ou ao menos o primeiro obstáculo a ser enfrentado é o de natureza política, do ponto de vista do poder e da organização institucional. Afinal, a criação e a gestão metropolitana, conforme o desenho constitucional de 1988, são uma atribuição dos estados que adotaram critérios e modelos distintos para todo o país, sendo que, na maior parte das RMs, a participação estatal está assentada em estruturas “teóricas” de paridade, vinculadas a fundos metropolitanos que não chegaram a existir, criados apenas no papel, ou que se tornaram figuras frágeis e não utilizadas.
O desenho que surge com a CF/88 de autonomia dos municípios e definição das RMs como incumbência exclusiva dos estados revelou um paradoxal arranjo político que, necessariamente, deve ser equacionado. Esse paradoxo está assentado em uma ordem política incompleta, marcada pela gestão metropolitana esvaziada de efetivo poder, autonomia e recursos; por incumbências concorrentes e compartilhadas que ainda devem ser arranjadas entre os entes federados; e pela necessidade de se instituir um marco legal e público que dê conta da associação entre os entes federados.
Os arranjos que necessariamente devem ser pensados para solucionar os problemas apontados são da ordem da pactuação federativa do país. A gestão de serviços de interesses comuns em territórios compartidos e o próprio planejamento e produção desse território implicam tanto o respeito à autonomia de cada um dos entes, quanto a partilha entre tais envolvidos de responsabilidades e, sobretudo, de poder. Não há, até o momento, qualquer modelo desenhado no país que consiga dar conta dessa dualidade.
O estado lança mão de alguns instrumentos, como os consórcios públicos, para implementar ações setoriais concertadas entre municípios e até mesmo entre municípios e estado, sobretudo nas áreas de saneamento e de transportes e no uso dos recursos hídricos.
Com efeito, recentemente aprovada, a Lei dos Consórcios, que veio suprir uma lacuna no que diz respeito à relação de cooperação entre entes governamentais distintos, mesmo que não especificamente desenhada para a gestão metropolitana, pode contribuir para a superação de alguns desafios que se colocam para a gestão metropolitana no Brasil atual. Exemplos na gestão de algumas funções públicas de interesse comum, notadamente na área da mobilidade,16 confirmam esta possibilidade, mas algumas funções públicas de interesse comum não constituem objeto ideal destes consórcios, sobretudo aquelas relativas ao planejamento integrado e à gestão do uso do solo.
O desafio aqui colocado é, pois, contribuir na definição de arranjos institucionais e instrumentos de “concertação” e cooperação entre os entes federados, possibilitando o efetivo planejamento e a gestão compartilhada de cidades que ocupem o território de mais de um município.
Tal meta tange à pactuação federativa ao ponto de questionar-se a necessidade de estabelecimento de novos marcos de cooperação, conforme prevista a regulamentação no Art. 23 da CF/88. Além disso, a participação popular em instâncias regionais é algo inovador e que está em marcha rumo a um novo modelo de gestão democrática.
Nesse sentido, questões sobre a eficácia e a efetividade das experiências e dos modelos de gestão metropolitana atualmente existentes no país e sobre o controle social na gestão metropolitana mostram-se legítimas e confluem para um amplo campo de investigação que passa pela própria avaliação da gestão das funções públicas de interesse comum nas diversas tipologias de RMs atualmente existentes no país.
Finalmente, e não menos importante, cabe refletir sobre qual papel tem a União nesse processo e qual, em face da situação apresentada, deveria assumir, inclusive no que diz respeito ao eventual papel das RMs face à promoção/facilitação dos processos de desenvolvimento regional/nacional.
A esfera federal se distanciou da discussão metropolitana, ainda que continue, em termos de investimentos em infraestrutura social e urbana, privilegiando esse espaço. Melhor e mais precisamente falando: há um distanciamento da União da gestão metropolitana, o que reflete tanto as condicionantes institucionais do federalismo brasileiro quanto a dimensão política da questão.
Nesse sentido, cabe salientar que a persistir a omissão do governo federal da questão metropolitana, e a permanecerem as dificuldades e as tensões no campo das relações intergovernamentais, é de se esperar o agravamento de alguns problemas sociais, econômicos e ambientais existentes nas RMs e nas metrópoles brasileiras, sobretudo aqueles decorrentes de uma gestão ineficaz das funções públicas de interesse comum, afetando de forma negativa a vida do cidadão metropolitano, ou seja, da maioria dos cidadãos brasileiros que vivem nas áreas urbanas do país.



Referencias: Faces da Metropolização no Brasil In: Brasil 2010. Infraestrutura social e urbana no Brasil : subsídios para uma agenda de pesquisa e formulação de políticas públicas / Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. – Brasília : Ipea, 2010. v. 2 (912 p.): Estratégicos do Desenvolvimento Brasileiro ; Infraestrutura Econômica, Social e Urbana ; Livro 6.

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